Neuropatia Periférica – Quando os nervos não sentem e não reagem

Funcionalitá • nov. 19, 2019

Dr André Macedo S. Silva, médico e pesquisador da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo e neurologista da Funcionalitá

Sentir e reagir são as características básicas dos seres do reino animal. Nós humanos, como topo evolutivo deste reino, aperfeiçoamos sobremaneira essas características. Precisamos sentir o ambiente, os cheiros, os sons, o tato, a temperatura e as dores. Assim reagimos ao mundo e nos movemos. Abaixamos, levantamos, subimos, descemos, andamos, corremos, choramos e sorrimos. Tudo como forma de interagir com o ambiente. 
 
Sensibilidade e motricidade são os domínios do nosso sistema nervoso que controlam essa via de mão-dupla que nos faz sentir e reagir. Sentimos o chão quente da areia da praia e por isso corremos rápido para debaixo do sombreiro do desconhecido. Somos empurrados e não caímos, pois reagimos mudando de posição, dobrando os joelhos e abrindo os braços.
 
Mas como fazemos tudo isso, o tempo todo, e nem pensamos? Bem, o cérebro e a medula espinhal são o centro do comando, que recebem todas as informações e processam todas as sensibilidades. Deste centro parte a ordem para que os membros reajam, para que o corpo se movimente, no final das contas, para que os músculos contraiam. Essas conexões são quase que instantâneas e ocorrem ininterruptamente, sem nem mesmo pensarmos nelas, como uma forma de arco-reflexo. 
 
Cérebro e medula espinhal formam o Sistema Nervoso Central, mas não são suficientes. São precisos caminhos para a informação de sensibilidade ir da pele e articulações para a medula espinhal, bem como para que o comando saia do sistema nervoso central em direção aos músculos na periferia. Os fios que fazem essa conexão de 2 vias, são os nervos periféricos. Os nervos periféricos, em conjunto com os músculos, formam o Sistema Nervoso Periférico, o verdadeiro receptor da sensibilidade e executor do movimento.
 
Quando os nervosos periféricos adoecem, chamamos pela forma genérica de neuropatias periféricas. Estima-se que 5% da população sofra de alguma neuropatia periférica. Esse número pode subir para 30% entre indivíduos após os 70-80 anos. Ou seja, trata-se de uma condição muito comum, mas também negligenciada. 
 
Os pacientes com neuropatia periférica se queixam de formigamentos, que começam nos pés; dores em choque, agulhadas ou queimação; alteração na coloração e temperatura dos pés; deformidades dos dedinhos dos pés, de suas unhas e pelos; desequilíbrio, principalmente ao fechar os olhos, câimbras e fraqueza, principalmente nas pernas. O diagnóstico depende do exame neurológico e na maioria das vezes da realização de exames complementares como a eletroneuromiografia e a ultrassonografia de nervos periféricos. 
 
As causas de neuropatias periféricas são muitas e merece fundamental atenção, pois algumas são tratáveis. Dentre as principais causas estão o diabetes, o etilismo, os problemas endocrinológicos (tireoide e síndrome metabólica), carência de certas vitaminas (principalmente do complexo B), doenças hereditárias e algumas doenças inflamatórias e autoimunes. Por isso a investigação da neuropatia periférica requer uma ampla investigação e o neurologista é o especialista mais indicado para realizar esta avaliação.
 
O tratamento das neuropatias periféricas depende essencialmente da sua causa. Se o problema por exemplo é a falta de vitaminas, a reposição pode reverter o quadro; se o paciente tem uma doença endócrina, o tratamento dela pode evitar progressão e até melhorar os sintomas; se a causa é o etilismo, a interrupção do uso do álcool pode diminuir a progressão e recuperar o comprometimento nervoso; se há inflamação nos nervos, a terapia imunossupressora (corticoide e imunoglobulina) podem reverter completamente o quadro e praticamente curar o indivíduo da neuropatia periférica. 
 
Entretanto, independente da causa, os pacientes precisam de avaliação por fisioterapeuta e a definição de uma estratégia de reabilitação neuromuscular, para melhorar equilíbrio, força e reflexos posturais, comumente prejudicados na neuropatia periférica. Os cuidados dos pés também são essências, pois a sensibilidade neles fica marcadamente diminuída, podendo levar a formação de feridas imperceptíveis pelo indivíduo. Assim, recomenda-se lavagem adequada, entre os dedos, secagem com toalha separada, sentado, de forma minuciosa, inspeção diária entre os dedos e na sola dos pés e uso de calçados confortáveis, não apertados e sem costuras internas. Assim, a combinação do tratamento médico, dos cuidados de reabilitação e a atenção do próprio paciente ao seu corpo é essencial para mudarmos positivamente a evolução da neuropatia periférica.
 
Referências
Amato AA, Russel JA. Neuropathies Associated with Infections. In: Neuromuscular Disorder. 2nd edition. Ed McGraw-Hill Education. 2016
Bromberg MB. An approach to the evaluation of peripheral neuropathies. Semin Neurol 2010;30:350–355.
Russel JA. General approach to peripheral nerve disorders. Continuum (Minneap Minn) 2017;23(5):1241–1262.
 

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